sábado, 16 de outubro de 2010


PÃO-POR-DEUS

    Houve um tempo em que o florescer do ipê era aguardado com ansiedade. A chegada dessa estação indicava que era época de aguçar a criatividade e fazer versos para as brincadeiras de pão-por-Deus. Através de cartõezinhos, geralmente em formato de coração, amigos e apaixonados trocavam alegria e amor.

    Não parece a toa que este período foi escolhido para lembrar o costume. Enquanto a exuberância das flores do ipê deixava as ruas mais agradáveis, as rimas do pão-por-Deus, humildemente, ajudavam a fortalecer amores e amizades. Ingenuamente, crianças e jovens apaixonados preservavam a cultura açoriana.

    Peço perdão aos amantes da nossa história pela ousadia de falar nesse assunto. Afinal, o pouco que sei sobre tradições como essa, foi o que ouvi da boca de alguns guerreiros com o rosto marcado pelo tempo. Sinto uma ponta de inveja de vocês, que viviam o amor romântico, mandando versinhos em formato de coração para as namoradas. E não me venham dizer, jovens leitoras desse blog, que não ficariam nas nuvens ao receber de seus amados versos como aqueles.

    Mais uma estação chega e o ipê floresce esperançoso. Enquanto nossos pequenos são estimulados a cultivar relacionamentos virtuais, ficando, assim, vulneráveis às frustrações.

    A luta pela preservação das nossas raízes tem sido abafada por aqueles que acreditam na existência de assuntos mais lucrativos. Será mais valoroso acabar com as formas de entretenimento da cultura açoriana? Quem sabe deve ser, já que para quem está no poder quando menos culto for o povo melhor. Claro, ninguém é obrigado a praticar a cultura, mas deve-se largar o preconceito às próprias origens.

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